Centro humano de enganos e atrocidades

Mãos ao alto, passageiros. Olhando pela janela. Isso aqui é um abuso. Eu vi o homem voar. Escorregue de seu conforto. Eu vi as asas falsas. Ponha lentamente a sua vida nas mãos. Aos olhos do pássaro homem. Dá-me a sua confiança. Que voa livre pela imensidão. Acalanta-me, pois eu não tive vida e não tenho conforto. Eu sou homem, disse o pássaro. Eu sou pássaro, disse o homem.

Do livro das perpetuidades

Certa vez, quando caminhavámos, eu de mãos dadas contigo, desliguei de ti.
Desliguei o meu medo de viver sozinha em uma casa sombria e vazia e de pensar em como seria monótono criar gatos. O bom, é que a suposta baixa percepção que os homens têm não deixou que você percebesse um só dos um milhão e meio de pensamentos suspeitos que viveram em mim durante uns trinta minutos.
Respirei fundo para me inebriar de oxigênio e vi um girassol amarelo solar, gigante e sorridente.
Abracei seu braço - a parte sua mais minha que tinha - e dei um beijo nele.
Que braço lindo, falei.

Margaridas perdidas na estrada para casa

os amontados de nuvem, itinerário dos incertos-delírio dos seres avoados - uma longa jornada até o paraíso - se tiveres preparado e tiveres música para sutilmente dançar - um caderno entre as utilidades para relatar o perfume das cores, a forma engraçada com que o vento desorienta o passarinho, as batidas de pé e coração, cabeças balançando de encontro ao pôr-do-sol, o sorriso que não é de boca e o alívio de saber que não importa para onde o vento nos leve, deixemos que vente e que vá.
pra subir ao céu só é preciso ter alma.

Passatempo

Nunca é demais, nem tampouco,
não faz diferença.
O mundo continua girando como sempre.

Tanto faz,
não sei ao certo,
me preocupo pouco.

deixe-me ir ou vamos.
ou fiquemos, ou deixemos
não importa
o mundo gira de qualquer forma

não estamos certos quando estamos certos
e não estamos errados como estamos errados
não estamos quando somos
não somos o que estamos
não sabemos do que se trata

se é drama, teatro, encenação
tanto faz que o mundo gira,
tanto faz se há razão,

o que importa é ter controle do ponto de rotação.

É...

O que é pra ser
é
e o que não é
não é
simples como
matemática
relativo como
a física
óbvio como
português
como a
literatura
é passível
de várias
interpretações.
dramático
como teatro
confuso como
filosofia
e difícil de entender,
assim como nietzsche.

Não tem perigo, não

não há
nem um pingo
de arrependimento
quando desço
correndo
os gigantescos
morros

adoro sentir
o vento
e se cair
levanta ou chora
- posso me desesperar
se eu quiser -
assino onde
existe o risco
me diga vamos
eu topo se for de bom agrado
gosto de decidir
descer o morro
de quando tudo vai bem
e se vai mal,
não faz tão mal.

Liberdade

o homem sentou em sua cadeira, ficou mudo, pôs seu disco de reggae dos anos 80, acendeu o charuto e ficou feito pedra como sempre ficara.
a mulher viu a criança chorando, a panela queimando, o mundo caindo
e o homem ali sem sair do lugar, sem mais nada a conquistar, parado ficar.

ela chorou arrancando o coração do peito.
amor nenhum vale a mediocridade.

Item 2.3.1

Alianças são laços feitos de fogo.
Escrevem, lentamente em brasa, histórias que não se apagam mais.

O que será que será?

Pode ser que seja

mesmo

que não dê pra
saber que
é

Sendo o que
parece ser
quando é e não é
o que fora

Parece que é
quando sendo,
não se percebe mais.

Conta-gota de felicidade

fantástico
como deve ser
e fácil
para trazer sorriso
sentido
mesmo quando
não faça
provavelmente
não estou
pensando
porque se estivesse
não teria graça
música
para rodar
a vida
taças
quase cheias
e quase vazias
na lei natural
dos encontros
no encanto
que faz suspirar
o meu coração
vazio de mundo
cheio de luz,
de cor de ameixas maduras
macias
mordíveis
como as bochechas
rosadas
como o azul do olho
do menino
mais bonito do universo
vem mais junto
vem mais perto
que eu não enxergo
se tá errado ou tá certo
mas não quero
porque eu sinto
um assovio
bem no peito
que me deixa assim
sem jeito
de dizer que cada
verso
não carrega no seu leito
nenhum desses sujeitos
que o meu verso
só existe
pra quem ri
e quem é triste
pra quem larga
e quem insiste
para os fortes
e os fracotes
para aquele que sozinho
vê na estrela o caminho
e a exalta baixinho.

Mi-au

vem cá
meu dengo
meu azul de céu
estrela brilhante
em noite
sem lua
meu pequeno
ser
de pé minúsculo
e fio de olho
quando faz careta
queria morder
cada dedinho
dessa sua mão
macia
tão querido,
pequenino
um amor,
esse menino.

Boa noite, criancinhas

como podem vigiar as torres os homens armados até os dentes?
onde vive a sede deste homem? e o sono deste homem?
e o que come, pobre homem?
não se come, não se dorme, não se bebe lá na fonte
lá no fronte, que é bem longe
vive um homem
que não cansa que não some
que não morre, ó bom homem
nem de frio e nem de fome
ele vive como amante,
de um só corpo, de uma imagem
de um instante.

Uma e quarenta e três

revistando o submundo dos lençóis e fronhas onde sonho bom está nublado e o corpo todo envolto de gotas de chuva marotas que não fazem frio e também não cantam, mas deslizam na pele fria de chuva fria que o cobertor não esquenta, esquenta com amor e traz café quente, tv cachorro de meia de lã que cor tem o céu azul de cinza e rola no colchão no pé da sala da cozinha o edredon está nas montanhas geladas de Austen, volta aui cachorrinho com a meia e põe água quente para o chá, ô meu frio vem me dar o sossego e traga chocolates.

Dedos

vou me vestir
de veludo
mergulhar
no amargo
doce
do vinho
sentar ao
piano
e compôr o

caminho
onde eu
o vejo
flutuar
no vento
que balança
o vestido
no mundo
quase vazio
no abraço
partido
no vermelho
do sangue
do delírio
do dilúvio.

Eqnj

olha aqui
no vão da porta
vem ver quem
olha pra gente
de dentro
pra fora
e escuta
as nossas
parafernálias
como se fosse
música
e vê a nossa carne
e sente a nossa
saliva
e suga tudo
da gente
querendo
que a gente
entrasse na deles
trancasse no quarto
a alma da gente.
Só há uma forma de chegar do outro lado do rio.
Percorrendo o caminho que chega até lá.

É mesmo.

quando são seis horas e meus olhos já cansaram de estar abertos por pelos umas trinta milhões de vezes e meu corpo já está estirado num sofá qualquer, enquanto rola um som e meus pés não conseguem parar de dançar, eu já li todos os livros da estante e já troquei absurdos com todos os que passaram por lá, eu os cansei e me cansei, então parei, emudeci. só olhei, só fiquei.
então por um minuto você passou na minha cabeça, mas não houveram sorrisos como antes.
não por este motivo, pelo menos. pois, bem nessas horas o sono me domina e se eu não cometo crimes eu incrimino criminosos e xingo a festa toda e canto a noite toda e esmurro as paredes que estiverem por onde elas estiverem e danço dominando a rua até pisar na lua.

À espreita

não se planejava esconder os fatos
esparavámos que o tempo apagasse os indícios
mas estavámos sempre a procura do assassino atrás da porta,
sob a cama, vivendo no nosso armário a espreita da nossa distração
enquanto isso apostavámos na auto-destruição e bebíamos a felicidade até não sobrar um só gole.
isso não é coisa de mundo, é de submundo. o medo tem nome próprio: Passado.

às vezes você pode ouvir alguém chamando

respira pulmão
bate coração
bota o pé no chão
sente a pulsação
boca branca e fria mão
levanta corpo
desse roda-mundo violento
põe de novo a cabeça pra funcionar
que do contrário
não fica nada para contar.
que eu queria é mesmo colapsar
juntar meus tremiliques num batuque incoerente
ouvir sirene, sirene, sirene.

Mais uma de se apaixonar

Tomara amanheça sol
e no fim da tarde chova
Tomara estejamos na rua
nesta hora e possamos
correr da chuva direto pra casa
Tomara você acorde de bom humor
pra me ajudar nas palavras cruzadas,
tomara tenha pra vender
doce de abóbora de coração de festa junina
Tomara a rotina não coma os nossos dias
e espero possamos colher amoras fora de época
Tomara possamos roubar flores,
fazer músicas,
colecionar momentos
e amores.

Como dizem os loucos

pode ser que sim
pode ser que não
pode ser que
o mundo rode
feito um peão

posso dizer sim
e posso dizer não
posso dizer coisas
que te levem à
confusão

pode ser razão
pode ser coração
pode ser realidade
ou fruto
da imaginação.