Curva de tolerância

Faz dias que eu escuto você dizer para eu parar
não faz sentido para mim, nem ser e nem não ser
eu, como o mundo, estou girando
e não tenho começo e não tenho fim

E se no seu pedaço de reflexão
existe chão, base, concreto
parabéns para o seu intelecto,
e parabéns pela sua falta de alma
que não é capaz de sentir uma misera migalha do que saiu flutuando pelos poros

quão incapazes são os homens,
em fazer sentir e em fazer acreditar.

faz sentido, muito mais esse do que outros, em fazer-se esquecer.

Floresta

Alguém pequeno como uma muda de planta
De barba cumprida e cheio de vitalidade
Leve como uma pluma - carrego-o nos braços
E prometo não apertar seu machucado.
De cabelos lavados, com um sorriso na mão
e mais dois voando.
Entender o desistir ou ficar rindo que nem tonta?

BLÉM!

FICAR RINDO QUE NEM TONTA!

(...)

Ponto pras mulheres!

(!)

Intenções

casa conforto cafuné
cama colcha café

meia, pijama, colchão
tapete, suor, pé no chão

eu: um mundo
você: um mundo
e o mundo rodando a gente.

13:49 e em todas as horas

ó pedaço de mim, que insiste em se aventurar
ora com razão, ora sem saber o que faz.
procurando você encontra,
nos confins da terra ou na cratera lunar.
procurando você se da conta,
que já sabe onde está.


Na sua casa

Eu dormi e quando acordei você já não estava mais.
Você muda, se transforma...
você esquece.
E cabe a mim lembrar você dos dias no bosque,
das risadas na barraca, nos colarinhos das camisas.
Ai, se eu tivesse tanta memória assim,
eu também esqueço e eu mudo.
Eu dormi e quando eu acordei eu já não estava mais em mim.

O que você não entende

Aquilo que mora no meu coração como razão são as palpitações
e os sentimentos eletrizam-no, sacodem-no, exaustam-no.

Minhas palpitações, meus sentidos, meu amor.

Mapas

Ela gritou: me espere!
Mas o homem não a ouviu gritar e continuou a partir sem ela.

Então sentou na calçada e chorou.
Sua voz não se fez ouvir e nunca fará.
Porque na dúvida de ir ou não, ela decidiu muda ficar.

Criança

Por que você fugiu para a floresta?
Eu estive por tanto tempo perdida, não quero me aventurar de novo entre os ursos.
Mas de que serve ter um coração pulsante que cedo ou tarde vai parar?

Desculpe-me, mas tenho medo da floresta.
Eu tenho medo da escuridão dos caminhos,
de me afogar em seu leito,
de sufocar amordaçada pelos nativos.

Muito embora eu tenha um arco e flecha,
soltando penas coloridas,
e tenha botas compridas.

Me arriscarei mesmo para não dar em nada,
e assim, perder o coração em flechadas.
Eu vou, mesmo que minhas pernas tremam.
Eu espero que te encontre,
te salve
e então possa te oferecer um chá.





vai ver eu posso voar e nem sei
eu só preciso tirar da cabeça que não tenho asas
e vou deixar meu coração aqui na terra,
seguro, quieto, guardadinho.
E tiro da caixa quando você nascer, benzinho.

Nós todos

Tão dificilmente sou uma constante
Ou qualquer coisa que o valha
Sempre um. sempre um. sempre um.
Nunca fui dois, mesmo quando eu fui.
Eu não sei o que é ser quando não estou sendo.
Nem sei explicar onde estão as pessoas que estavam aqui agora.
Eu pisco e já vejo diferente, porque então eu racionalizei o mundo.

Lutando entre sentir e ser
eu perco.
Eu sempre acabo perdendo tudo;

Em uma rua gelada

Raras são as vezes eu experimento o frio do centro da cidade pela noite, mas sempre que isso acontece eu tenho a oportunidade de presenciar uma mesma situação, que sempre se repete (em gênero, número e grau) e vive partindo o meu coração, mas parte-o de um jeito bom.
Eles passam por mim, sempre que estou lá. São um trio, mais uma quarta pessoa junto a eles, porém se vê que é apenas um acompanhante. São eles: um homem, uma mulher e uma criança.
A mulher é uma moça de 30 vestida como uma senhora de 50, seu marido é um homem de jeito simples que aparenta ter lá uns 40 anos de sofrimento e a criança é alguém de 9 ou 10 anos.
A mulher carrega nos braços livros e cadernos e em seu corpo aparenta carregar uma criança. Ela, o homem e o filho andam de mãos dadas. Não sorriem nem conversam, mas também não parecem estar tristes.
Eles não tem nada demais e quando eles passam ninguém percebe. A não ser por mim que tenho por companhia o vento.
Eu os olho e penso na coragem daquele homem e na força que existe nas pessoas.
Familia não é viver debaixo do mesmo teto e comemorar aniversários. E amor não é pagar as contas.
Familia é aquilo: andar no frio, esperar o ônibus e chegar tarde em casa para acordar cedo no outro dia. Familia é estar junto, ficar junto, suportar junto.
E amor, bem, não sei realmente dizer, mas eu vejo amor naquela gente. E me orgulho deles. Um dia eu quero ser feliz assim.

Louça branca

Eu te disse: não vá, não vá.
Mas você precisava ir.
Eu imaginava viver em casas azuis de cercas brancas,
esperava por sorrisos diurnos, cigarros bicolores, xícaras em duplicidade,
algumas crianças, retratos de família.

Eu não te disse para ficar, embora eu tenho dito que disse.

Eu fiquei muda, muda de sorrisos, coisas diurnas, louça em duplicidade,
roupa para passar, manha de criança, porta-retrato.

Então eu falei mas também emudeci.

Equivoquei-me sobre o que quis dizer, sobre o quis fazer, ou o que eu quis que acontecesse,
então eu sorri.
Sorri por não ter mais o que fazer.

Para lugar nenhum

O meu coração bateu depressa,
apressados foram os suspiros, os sopros.
E eu gostaria muito, mas não consigo conter-me
nem em gestos, nem em palavras, nem em vontade.

Pareço mais impulsiva do que realmente sou,
talvez porque eu corra demais,
ou sinta demais,
ou procure viver demais.

Meu eu

Foi tomando um banho
(após tomar-me a chuva)
que eu pude perceber.

Existem:
o eu -
adorador de romances;
o eu -
apedrejador de romaces;
e finalmente o eu -
fugitivo de romances.
Que penso eu (não sei bem dizer qual) é o "eu maior".
Afinal, sendo o eu adorador ou o eu apedrejador,
eu sempre acabo fugindo disso tudo.

Eu que nunca acreditei em milagres

Você não tem juizo, eu friso
e diz não ter pecado (não creio)
diz: mundo é conspirante, tratante
e navegante sem rumo
não tem porto, eu digo.
Me diz só coisas doces, me abraça
faz do nosso o último romance,
e deixa inebriante, calmante
o último suspiro.

Em luar se apresenta perigo
me fere com espada cortante.
E em tudo que mostrava amigo,
revela-se mundano, farsante.

Não mais que de repente

O vento tem mania de me trazer lembranças,
e junto delas a saudade.
Saudade de olhos que brilham
e dentes engraçadinhos
saudade de dizer vem
(repulsa de dizer chega)
saudade das inspirações,
dos sorrisos,
de fazer planos, contemplar sonhos.
Saudade de abraços que tem significado,
de mãos dadas,
de ter por quem olhar.

A espera

Lindo dia, desses que dá pra ver a sombra das coisas.
As borboletas estão passando
(elas têm a cor da minha saia)
As nuvens são só um borrão no céu,
e sob o sol eu me sinto acolhida.
Agora o vento vem trazendo as folhas até mim,
brincando comigo.
Eu sei que pode soar repetitivo,
mas parece que é só porque eu gosto,
que o dia nasce dessa forma.